Água, Corpo, Casa
Pintura
PORTA33 — 16.03.1993 —19.04.1993
Água, Corpo, Casa
Eduardo de Freitas é um artista que pinta com a alma e com os pincéis mesmo quando não deseja pintar
o que pinta. Ou, dizendo de outro modo, Eduardo de Freitas pinta de uma maneira intangível o que
pinta para além do que inventa.
Parece que pinta "exactamente" aquilo que não quer pintar mesmo quando pinta. Ou mais do que isso.
Nas buscas e experiências, sempre constantes e insatisfeitas que pratica, procura quase o que não
pinta ou insiste pintar o que até não encontra.
Aí reside a sua persistente insatisfação. O lado quase onírico da criatividade apossa-se dele e
subjuga-o, contamina-o e subverte-o à aliciante convicção do que sinceramente vai descobrindo.
A diversificada face de se exprimir ou de querer expressar o que sente, transporta-o à tortura
permanente de pretender a forma que se esquiva ou a cor que se dilui e esgarça.
Existe uma espécie de obstinação em descobrir o que, por vezes, não descobre ou se abafa na múltipla
função da vontade de querer descobrir.
É um artista cuja insatisfação o pode levar até onde ele nem calcula, isto é à imperceptível margem
ou esquiva referência que teima em se negar. No fundo, lá bem no fundo, parece tratar-se duma pura
necessidade de querer ser nem que, para tanto, dilua o próprio ser.
Existe realmente em Eduardo de Freitas a latente intenção de desvendar o cerne incandescente do que
afinal sente e onde mergulha, de certa maneira inviolada, naquilo que o encanta e que, por vezes,
até parece traduzir-se num estranho desencantamento.
Seja como fôr, Eduardo de Freitas, assume uma permanente insídia. Isto é, adere a determinada
convicção e, por outro lado, destrói o alvo conquistado para caminhar, de seguida, no sentido
imprevisto de outra preocupação.
Basta reparar nas suas obras tão dispares umas das outras para se assistir a essa premente
controvérsia que lhe batalha o espírito. A separação dos seus trabalhos por temas (Água, Corpo,
Casa) espécie de radicalização em agrupamentos criativos, oferece um exemplo flagrante da sua
procura através de leituras distintas e determinantemente marcadas.
Se a luta pela "diferença", apanágio obcecante de muitos artistas contemporâneos, chega a atingir
uma evidente gratuidade, isso não se dá com Eduardo de Freitas mais preocupado em encontrar-se a si
próprio e consequentemente em descobrir a autêntica expressão escondida que nele persiste. De facto
a malfadada "diferença", como valor em si mesma, não o atinge nem o afecta.
No entanto, se Eduardo de Freitas ao viver numa ilha, e para mais numa ilha tão pequena como a
Madeira, cujo escasso perímetro esmaga e reduz qualquer tentativa de personalização, por mais forte
que seja, por outro encontra-se afastado das nefastas influências e vícios que proliferam e
facilmente seduzem os mais incautos que vivem nos meios grandes e mais desenvoltos de manifestações
artísticas, roubando-lhes a própria individualidade criativa.
Mas então qual será o maná salvador? Qual a maneira de resolver semelhante situação?
Claro que tudo isto não passa, antes de mais, duma condição profundamente cultural em consequente
ligação com o meio geográfico. Ou seja, sem dúvida que, quem quer que seja rodeado sobretudo de
caranguejos, não pode tranformar-se em Miguel Angelo nem um embrionário Miguel Angelo desabrocha
somente rodeado de crustáceos. Na realidade, trata-se duma questão de raíz cultural que, por
expressas razões óbvias, é, entre nós, o móbil por demais evidente e imperioso.
Ainda nos encontramos muito distantes da "aldeia global" planetária na qual possamos beber convictas
soluções, pelo menos hormonais, onde o reduzido vulto insular, como a Madeira, consiga inserir a sua
diminuta geografia.
Por isso mesmo, o trabalho e aturadas buscas de Eduardo de Freitas têm requerido nele uma
preocupante convicção. Daqui o seu mérito, daqui a razão da sua persistência dentro da esmagadora
restrição insular, tentando afirmar a sua convicta criatividade.
António Aragão
Nasceu no Funchal a 8 de Novembro de 1955
ALGUMAS EXPOSIÇÕES COLECTIVAS
1980 - " Bienal de Vila Nova de Cerveira".
1981 - "ARTILHA", Funchal, Lisboa, Porto, Évora.
1982 - "PATIO", Funchal 1984 - "Muestra International de Poesia Visual" en Castilha, La Mancha.
1985 - "Seis Novos Artistas Plásticos", Funchal. 1986 - "I Bienal de Poesia Visual", México
1987 - "MARCA". I Mostra de Artistas Plásticos da Associação de Artistas Plásticos da Madeira, Funchal
1988 - "Insinuações & Propostas", AAPM, Funchal
1989. "WOAUH", Funchal
1990 - "POET ARTE 90, Poesia Ilustrada, Funchal
1991 - "Efabulações", Funchal
"Olhares Atlánticos", Lisboa
"Timor mais perto", A APM, Funchal
1992- Painel Colectivo na EXPOJOVEM (c/ Filipa Venâncio e Ligia Gontardo), Funchal
Colectiva no mesmo certame.
1° Prémio Pintura, Concurso de Artes Plásticas, Festival de Música da Madeira, Funchal
Mostra de Arte na discoteca Vespas", Funchal
Está representado na colecção do futuro Museu de Arte Contemporânea da Madeira
OUTRAS ACTIVIDADES
Cenografias e adereços para Teatro: TEF, Funchal, 1979, 80, 81, 88; COMUNA, Lisboa, 1981
Ilustrações para textos literários e capas de livros editados na Madeira
Elemento co-fundador da Galeria Porta 33 e da Associação Cultural Quebra-Costas, no Funchal