ABRIGO E OBSERVATÓRIO DA NATUREZA

O desejo de desenhar o edifício nasce da vontade de tentar esfumar o infortúnio que lhe está na origem.

Os incêndios de 2010 percorreram o maciço montanhoso central da Madeira, deixando para trás um vasto rasto de destruição.

É neste contexto de ruina e necessidade de reconstituição do legado perdido que nos encontramos. Queremos prestar o nosso contributo materializado nesta pequena construção, fortemente influenciada pela tradicional casa de santana, concelho onde se irá localizar a nova construção.

Construída com o reaproveitamento da madeira de extensas áreas de árvores queimadas, a estrutura será recoberta com o solo do próprio local.

A construção é suporte para matérias vegetais. É abrigo. É um observatório da natureza.

REFORMULAÇÃO DA BAÍA DE CÂMARA DE LOBOS

Ao partir de uma análise e interpretação do território e paisagem existentes, procura-se encontrar uma ordem que organize um conjunto de edifícios e espaços diversificados em dimensões, carácter e usos diferenciados.

Redefine-se o “vazio” preexistente, propondo a continuidade como espaço urbano, fundamental como contraponto à densidade de massa construída envolvente.

Modela-se o “vazio” através de um plataforma mineral, um plano inclinado que se desenha à semelhança da praia de calhau rolado. Esta plataforma inclinada encaixa-se entre um conjunto de percursos abertos a Norte e a Sul, construindo a fusão intencional entre ambos, procurando o equilíbrio de relações entre a cota alta e a cota baixa deste lugar, sendo rematada nos seus extremos por edifícios que fazem a âncora com a malha urbana .

A Oeste um conjunto de edifícios fazem a frente de rua e terminam o quarteirão, destinando-se a serviços, indo de encontro à lógica programática naquele local. Próximo do bairro dos pescadores que se desenvolve ao longo do Caminhos das Trincheiras, um centro de eventos e uma casa de barcos fecham a intervenção a Este, numa proximidade com a actividade piscatória que é a essência deste lugar.

CASAS MIRADOURO

No anfiteatro da baía, um maciço arbóreo pode ser entendido como o último reduto numa área em tempos considerada como a mais elitista da cidade do Funchal.
Resta-nos esta enorme oportunidade de preservar e de dar continuidade à memória das quintas, cujos lotes são fortemente marcados pela presença de pérgulas decorativas, estruturantes de sombra, e por uma vegetação luxuriante e exótica.
A arquitetura aceita esta condição de fenecimento e corporaliza a habitação como se de uma árvore se tratasse, que pode ser lido e entendido como uma grande copa complementar às árvores de um lugar próximo.
Fixa-se o desenho com a memória dos jogos de luz e sombras produzidas pelas pérgulas desenhadas nos jardins destas quintas, com a recordação dos perfumes das plantas aromáticas juntas às cozinhas, e com as fragrâncias e cores das plantas e árvores de fruto. Surge assim uma casa entre as árvores, e como uma árvore, liberta a sua copa em determinados pontos deixando espiar a cidade.
Um maciço construído e suspenso como a copa de uma árvore, que pretende procurar e principiar a descoberta dos valores sensoriais de uma hospitalidade adequada a este lugar, onde a permanência e a estadia potenciam todos os seus valores e características.
A experiência culmina na visita ao terraço que se liberta sobre cada uma das coberturas, onde se pode disfrutar de uma vista privilegiada sobre a baía do Funchal, com as suas constantes mutações cromáticas e urbanas, ou sobre o vasto horizonte onde se pode pousar o olhar.
Um lugar que é simultaneamente um oásis numa mancha de ocupação...Um mirante para espiar a cidade inteira...

CENTRO DE ARTES CASA DAS MUDAS

Numa linha de festo que termina abruptamente sobre o mar, um maciço rochoso impõe-se sobre a paisagem. Um território expectante...
As deslocações rápidas e confusas impossibilitam a descoberta do território, daquilo que o compõe, das suas valências, das suas particularidades, das suas riquezas escondidas entre "o comum".
Confrontamo-nos com esta necessidade de observação, esta descoberta...este espantar.
A arquitectura aceita esta condicão e através de uma plataforma...mineral e sofisticada abaixo da "casa das mudas" convoca o valor paisagístico para depois retornar a ele, inventando (uma) paisagem.
Principia-se o desenho de um mirante. Um momento de pausa e contemplação que recupera a velocidade lenta da leitura da paisagem, agora, em parte, quebrada pelos túneis e estruturas viárias rápidas. Ao esculpir, cuidadosamente, essa plataforma propõe-se uma dualidade funcional na qual se concentra todo o núcleo museológico. Os rasgos cuidadosos procuram colocar em evidência esta paisagem em espera, colocar em evidência a sua banalidade, o seu valor. No interior desta "nova montanha", os pátios e os percursos seccionam, escavam e relacionam todas as funções, procurando contrapor a envolvente em determinados momentos, verticalmente na relação com a montanha e horizontalmente com o infimo atlántico. Os percursos são continuos, intersectam-se, tornam-se labirinticos, ligam programaticamente e com fluidez todas as funções.
Redesenha-se a "massa montanhosa", onde apenas na aproximação calma, lenta, pautada é que se revelam a sua interioridade e complexidade. E somente neste processo de descoberta de leitura, de observação cuidada do território que se descobre esta (nova) topografia.

CASA PARA O OCEANO

Na linha limite da terra, uma pequena construção militar com o propósito de vigilância e de proteção das invasões à costa insular, foi gradualmente adquirindo um estado lento de esquecimento à medida que perdia a sua utilidade num processo de desvanecimento. Confrontada hoje por uma “invasão” por terra, pela turistificação no seu contorno, foi pouco a pouco “apagando” a estrutura do lugar, exaurindo todos os seus valores...resultando numa intempérie atrópica.
Resta-nos este “tempo”...uma ruína construída em pedra basáltica negra em constante diálogo com o vulcão. Um buraco negro que nos faz retomar ao valor do lugar e que é, simultaneamente, um oásis. Permanece (um) forte. A arquitetura aceita esta condição e propõe dois tempos de habitar. Parte da clara delimitação arqueológica, convocando o seu valor iconográfico para depois retomar a ele, transformando-o e inventando um futuro.
Fixa-se o desenho fazendo uma incisão oposta em que se ergue uma casa dentro das ruínas: uma “ruína invertida” para descobrir e ensaiar valores de uma (nova) morada.
Ensaiam-se dois momentos de estadia para este lugar. Um entre os limites oferecidos pelas paredes de pedra, cuidadosamente aparelhadas, e outro, um bloco criteriosamente encerrado, que levita sobre tudo, restringe tangencialmente das “invasões de terra” e (re)inscreve uma forma de defesa que está na génese deste forte...privatiza e domina o espreitar para a imensidão do oceano.
Pelos materiais fixa-se a memória, a sua cronologia, o “lenço negro” de lava constrói a linha limite feita pelo vulcão, o “anel negro” de pedra basáltica constrói o forte, o “bloco negro” de barramento em cinza vulcânica, constrói a (nova) espia...é na relação entre estes que se constrói uma sutura matéria.
De volta ao (novo) forte, defende-se a experiência do corpo como recetor dos estímulos sensoriais, (re)escrevendo para todas as valências deste lugar: o som, os aromas, o vento, o mar...o espantar para o horizonte...
(Um) horizonte para a “cura e reparação”...de um lugar